Aparte
Jozailto Lima

É jornalista há 40 anos, poeta e fundador do Portal JLPolítica. Colaboração / Tatianne Melo.

Raymundo Juliano, uma história de vida que tinha que dar em livro. E deu!
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“Raymundo Juliano: 80 anos negociando e fazendo amigos”: obra de fôlego sobre uma vida longa

Deu, e vem com o sugestivo título de “Raymundo Juliano: 80 anos negociando e fazendo amigos”, com 430 páginas de muito por contar do muito que que ele fez, do muito que dissera em vida e do muito que dele disseram os amigos e os parentes.
A biografia “Raymundo Juliano: 80 anos negociando e fazendo amigos” foi escrita com suor e dedicação pela geógrafa e sobrinha dele, Juliana Souto Santos, com o auxílio luxuoso da geógrafa das geógrafas sergipanas, a professora aposentada da Universidade Federal de Sergipe Vera França, que assina a orelha do livro.

Raymundo Juliano Souto dos Santos faleceu no dia 21 de agosto do ano passado em um hospital na cidade de São Paulo. Ele havia nascido no dia 8 de julho - o dia da emancipação de Sergipe – de 1932, na histórica Estância, da qual se ausentou fisicamente muito cedo, passando a morar em Aracaju, mas de onde nunca afetivamente saiu.
Raymundo Juliano gabava-se ter trabalhado 80 dos 88 anos que viveu. Ou seja, conheceu as pelejas funcionais desde os oito anos de idade. A biografia vai apontar um fato incontestável na esfera desse personagem da vida sergipana.

“Raymundo Juliano é sinônimo de brio, grandeza, orgulho, distinção, altivez, sabedoria, protagonismo, empreendedorismo e liderança”, define a biografa ele.

“Junto com outros grandes mestres, integra o patrimônio e a memória da economia local com outros renomados homens que contribuíram para eficiência e desenvolvimento de Sergipe, como Júlio Prado Vasconcelos, Gentil Barbosa, Mamede Paes Mendonça, José Augusto Vieira, entre tantos outros”, reforça Juliana Souto, que tem 54 anos e é mestra e doutora em Geografia.

“Raymundo Juliano: 80 anos negociando e fazendo amigos” será lançado na próxima segunda-feira, 25 de outubro, às 17 horas, durante um evento de inauguração da Unidade do Sesc Comércio, na Avenida Otoniel Dória, 464, onde o biografado será referendado com um Memorial Raymundo Juliano, em que o histórico da sua vida vai estar em exposto e preservado.

Nesta quinta-feira, 21, a geógrafa e biógrafa Juliana Souto manteve uma ampla conversa com a Coluna Aparte sobre a biografia e o biografado, e é o que vai a seguir.

Aparte - Juliana, o que é que o leitor vai encontrar nas páginas do livro “Raymundo Juliano: 80 anos negociando e fazendo amigos”?
Juliana Souto -
O leitor vai encontrar uma narrativa contundente sobre a vida de Raymundo Juliano Souto dos Santos na íntegra, abstraída de 25 entrevistas realizadas com esse personagem emblemático da economia sergipana do século XX e das duas décadas do século XXI.

Aparte – Quando ele começa a lidar com o trabalho?
JS –
Ah, desde a infância em sua terra natal, Estância/SE, quando sua inquietação o levou a tornar-se engraxate e vendedor de jornais, com apenas 8 anos de idade, até tornar-se balconista, pracista, caixeiro viajante e, assim, adquirir seu primeiro negócio, o Bar Central, na principal avenida da cidade sergipana.

Aparte – Depois é ele muda-se para Aracaju?
JS – Sim.
Inserido no ambiente comercial, entrou para o ramo das bebidas Antárctica, sendo, por 30 anos, o único distribuidor em Sergipe da marca, até desvincular-se dela e diversificar seu patrimônio, constituindo o Grupo Raymundo Juliano, configurado por uma série de empresas que atuam no mercado local, com rede de supermercado - atacado e varejo, que é o caso da Fasouto -, construção civil, comércio de automóveis, postos de gasolina, hotelaria, agronegócio, imóveis, água mineral entre outros. 

Juliana Souto Santos: garimpo forte para reconstituir em palavras a vida de Raymundo Juliano

Aparte - Pelo que a senhora pesquisou, “negociar e fazer amigos” eram atitudes que andavam mesmo juntas na ação desse empresário ou era apenas um bordão?
JS -
O jargão “negociar e fazer amigos” é a própria representação simbólica daquilo que o empresário Raymundo Juliano compreendia sobre as relevantes estratégias de marketing, fidelização de clientes, condições de vendas e negociações junto ao mercado local, regional e nacional para se constituir, se manter firme com capital de giro e possibilidade de acumulação que o permitiram manter-se no topo da cadeia econômica durante 80 anos de atuação e contribuição para a economia sergipana. Isto porque Raymundo Juliano possuía a sagacidade, a sensibilidade e o entendimento a respeito das táticas necessárias para multiplicar seu patrimônio, oportunizando, somente no auge das Distribuidoras de Bebidas Antárctica, trabalho para cerca de 400 colaboradores em todo o Estado de Sergipe.
 
Aparte - Para além dessas atitudes, o que mais caracterizou Raymundo Juliano como empreendedor em Sergipe?
JS –
A maior marca e contribuição de Raymundo Juliano para a economia sergipana se concretizaram quando o empresário se mudou de Estância para Aracaju e fundou a Distribuidora de Bebidas Antárctica Raymundo Juliano - Disberj. Empresa essa que ele gerenciou por aproximadamente 30 anos, tendo sede na capital e com uma distribuidora em cada cidade polo de Sergipe - Estância, Lagarto, Itabaiana, Nossa Senhora das Dores, Nossa Senhora da Glória, Nossa Senhora do Socorro, Propriá e Aracaju. Isto porque, quando se tornou distribuidor das bebidas Antárctica em Sergipe, o gosto das pessoas para cervejas, sobremodo, estava voltado para a Brahma. Depois de planejar e trabalhar, diuturnamente, Raymundo Juliano conseguiu contornar e driblar a situação, impingindo o gosto da Antártica no paladar dos sergipanos, através de uma série de ideias que ele implementava como, por exemplo, os memoráveis festivais de cervejas, que promoveu em diversos municípios sergipanos. 

Aparte - Raymundo Juliano, dispunha, então de uma boa visão de marketing...
JS -
Sim, e com atitudes como essa, Raymundo Juliano se qualificou cada vez mais, atingindo a marca de vendas de 400 mil caixas de cervejas ao mês em 1990, o que o fez galgar o reconhecimento, o mérito e a honraria nacional, sendo eleito o distribuidor das bebidas Antárticas no Brasil, título esse disputado por 300 outros representantes. Contudo, quando a Antárctica e a Brahma foram fundidas, tornando-se Companhia de Bebidas das Américas - Ambeve -, ele vendeu a representação e diversificou seu patrimônio, criando o Grupo Raymundo Juliano, que adentrou em diversas áreas do mercado sergipano. Por tudo isso, Raymundo Juliano é sinônimo de brio, grandeza, orgulho, distinção, altivez, sabedoria, protagonismo, empreendedorismo e liderança. Junto com outros grandes mestres, integra o patrimônio e a memória da economia local juntamente com outros renomados homens que contribuíram para eficiência e desenvolvimento de Sergipe, como Júlio Prado Vasconcelos, Gentil Barbosa, Mamede Paes Mendonça, José Augusto Vieira, entre tantos outros.
 
Aparte - Quanto tempo a senhora investiu na pesquisa sobre a vida dele?
JS –
Foram dois anos de pesquisa, distribuída entre projeto, coleta de dados teóricos, leitura de documentos de fontes, nos arquivos e no seu próprio acervo documental, em sites da imprensa local, realização de entrevistas, elaboração e produção textual, edição, capa, fotografias entre outros aspectos que uma obra dessa natureza demanda. 

Aparte - Causou-lhe conforto desenvolver esse trabalho?
JS -
Sim, essa foi uma obra prazerosa de escrever, porque se distribuiu entre as muitas recordações, vivências e conhecimento factível em função da proximidade e do próprio amor em construir e apresentar ao público toda essa trajetória sistematizada e organizada, com grande honra e satisfação.

Raymundo Juliano: dedicação ao trabalho, ao bom humor sempre e à amizade

Aparte - Com quantas páginas ficou “Raymundo Juliano: 80 anos negociando e fazendo amigos”?
JS -
A biografia de Raymundo Juliano está organizada em cinco capítulos, contendo todas as etapas de vida dele. Sendo assim distribuídos os capítulos: I. RJ: Infância, Adolescência e Iniciação Profissional; II. Linhagem: Casamentos, Filhos, Netos e Bisneta; III. Saga do Caixeiro Viajante; IV. RJ: Um Empreendedor Impetuoso no Mercado Sergipano e V. Contribuições Socioculturais e Honrarias Recebidas. Contudo, no anexo da obra, foi inserida uma série de reportagens e entrevistas publicadas na imprensa sergipana sobre sua atuação no mercado local. Além disso, Raymundo Juliano, como um sujeito histórico, visionário e conhecedor da sua potencialidade, classificou e construiu um verdadeiro arquivo pessoal constituído de fotos, honrarias, títulos, registros dos estabelecimentos comerciais e dos imóveis, documentos pessoais e dos familiares, entre outros, que contribuiu com a construção do livro, assim como permitiu a instalação do Memorial Raymundo Juliano dentro do SESC do Centro da capital sergipana, que receberá seu nome, desenvolvido pelo arquiteto e curador Ézio Déda, com sua equipe de conceituados profissionais, que desvela a trajetória de vida desse empresário, forjada nas mais diversificadas fases da sua caminhada como genuíno empresário e empreendedor. De modo que o livro tem 430 páginas, bem organizado, sendo a edição da editora Criativa, sob o olhar profissional de Adilma Menezes e impresso na Gráfica J. Andrade.

Aparte - Havia um bom legado de falas e depoimentos dele na mídia de Sergipe, à qual a senhora recorreu, ou teve dificuldade?
JS -
A principal delas é exatamente a que nós utilizamos para intitular a biografia, “negociar e fazer amigos”. Mas, com seu espírito auspicioso, inovador, visionário, empreendedor, impetuoso, determinado, contente e sorridente, dentre outros, Raymundo Juliano colecionava bordões, como “torne-se um líder recomeçando todos os dias”; “nunca se esqueça de perseverar para realizar seus sonhos”; “o bom líder oportuniza e conquista seus colaboradores”; “é preciso reconhecer o valor das pessoas para elas darem o seu melhor”, entre outros tantos que os motivou em sua persistente caminhada.
 
Aparte - Por onde é, em Sergipe, que Raymundo Juliano começa a empreender, e em que área?
JS –
Raymundo Juliano começou sua jornada empreendedora em Estância. Após viajar uma década como caixeiro viajante pelo sul sergipano e norte baiano, representando a Loja de Secos e Molhos Pinheiro Alvélos, conseguiu reunir economias e com o suporte do empresário local Pedro Barreto Siquera, adquiriu seu primeiro negócio, aquele Bar Central, na Avenida Capitão Salomão. Sua astúcia o fez vislumbrar naquele local um mundo de oportunidades, que o levaram a fazer dali um bar, uma lanchonete, uma pequena rodoviária e, simultaneamente, um ponto efervescente de encontros e despedidas. Em um município próximo, fundou a torrefação Raymundo Juliano, para não precisar comprar o café que vendia. Assim, ele evidenciou sua capacidade criadora, seu tino e astúcia para se estabelecer no mercado, multiplicar seus empreendimentos e diversificar seus negócios.

Aparte - O livro cobre que período da vida dele - ou toda ela?
JS -
Tratando-se de uma biografia, o livro cobre todas as fases da sua longa e bem vivida existência. Raymundo Juliano nasceu em 8 de julho de 1932, na Antiga Travessa do Mercado, em Estância. Ao  abrir a porta da residência, o menino deparava-se com um cenário inusitado, a feira da cidade, no qual iniciou seu trato com o dinheiro, engraxando sapatos, vendendo jornais, ajudando no balcão da loja dos pais. Mas foi na Loja Esperança, do senhor Adelaido Souza, seu padrinho e pai da ex-deputada Tânia Soares de Souza, que ele obteve seu primeiro emprego como balconista, o que o levou para a saga do caixeiro viajante com o Grupo Pinheiro  Alvélos, portugueses estabelecidos no comércio estanciano. Filho de Agripino Roque dos Santos e Mariaht Amado Souto dos Santos, ele é o segundo de uma linhagem de sete filhos. Daí em diante, Raymundo Juliano se propôs a desvelar o universo econômico e do mercado sergipano. 

Juliano Cesar e o pai Raymundo Juliano: um guardião da memória afetiva paterna

Aparte - A família foi colaborativa no fornecimento de dados biográficos dele?
JS –
Sim. A família permitiu que a biografia fosse elaborada com sucesso, sobremodo em se tratando da pesquisa empírica e coleta dos dados. O fato de Raymundo Juliano estar vivo durante a construção da obra, foi muito importante, porque ele pode desvelar as questões que eu tinha dúvidas. O fato da saúde do biografado estar em estado de debilidade, em função dos problemas que o mantinha na condição de cadeirante, mas a lucidez de Raymundo Juliano foi de suma relevância, haja vista que foram muitas conversas presenciais e a distância, ao celular, que nós íamos desvendando, confirmando, elucidando os diversos aspectos e momentos e conjunturas com as quais ele conviveu e compartilhou desses diversos momentos comigo. Além, com certeza, das aproximadamente 65 entrevistas realizadas com diversos colegas, amigos, familiares, colaboradores, companheiros de entidades, de jornadas, conhecidos, conterrâneos, sócios, entre outros, que, cada um ao seu modo, nos apresentou aspectos diversificados da relação desenvolvida com esse grande empresário local. Sobremodo, seu filho Juliano César Faria Souto, a quem eu agradeço muito, pois acompanhou esse passo-a-passo metodológico tendo nos orientado a respeito dos nomes desses vários personagens que protagonizaram, com Raymundo Juliano, toda essa construção que integra o mosaico de representações socioeconômicas e socioculturais que só beneficiaram a história econômica contemporânea de Sergipe.  

Aparte - Como é que a senhora classifica a maneira como Juliano Cesar Faria Souto preserva a memória do pai?
JS -
Juliano César e as irmãs Ana Suely Faria Souto Teles e Cynthia Faria Souto experienciaram uma série de vivências no interior das empresas do Grupo Raymundo Juliano, absorvendo toda uma expertise que assegurou a formação de um arcabouço básico que qualquer empresário necessita, mas também porque simultaneamente, Raymundo Juliano foi efetivando a sucessão do patrimônio do Grupo RJ. Todos eles são tarimbados e mesmo podemos afirmar que são veteranos em suas realizações, porque foram iniciados muito jovens e fizeram opções de estar com o pai, atuar com ele, preservar o patrimônio, assim como a memória histórica que nos remetem quando pensamos nos benefícios que o Grupo gera para Sergipe. Assim, a concepção e a determinação de Juliano César na preservação da memória do pai incide sobre o enorme desafio e responsabilidade que adquiriu na sucessão dos empreendimentos e está evidenciado pela suas competências, que perpetuam, igualmente, sua habilidade e autenticidade para a preservação da memória paterna.

Aparte - A senhora contou com a assessoria de alguém na formatação final do livro?
JS –
Contei sim com a consultoria da professora e doutora Vera Lúcia Alves França, que além de ter sido minha orientadora no doutorado em Geografia, no Programa de Pós-Graduação em Geografia da UFS, é uma grande amiga, mentora e conselheira, que me auxiliou em todo o processo de criação e elaboração da obra. Eu agradeço muito à professora Vera França que se fez presente, inclusive, me acompanhando, diversas vezes, aos momentos de realização das entrevistas com meu tio, a pedido dele. Em 2018, quando contactei com ele e contei que ela estava me orientando na produção do material sobre ele, meu tio pediu que eu a convidasse para ir até sua residência para começarmos os trabalhos. Então, tudo ocorreu da melhor maneira. Sou muito grata a todos. 

Aparte - Por que o livro não fora lançado com Raymundo Juliano ainda em vida?
JS -
Nós fomos acometidos pela pandemia do coronavírus e não houve tempo hábil para o lançamento do livro com ele em vida. Entretanto, um exemplar dessa tiragem de mil exemplares que Juliano César mandou imprimir na J. Andrade chegou às mãos de meu tio em março de 2020. Ele mandou um Whatsaap e um exemplar também, dizendo ligue para RJ, fale com ele. Nós corremos muito, porque ele já estava muito fragilizado mesmo, foram muitas hospitalizações e trabalhamos sem parar, até que o saiu da gráfica. Foi uma glória que ele recebeu e gostou muito. Quando a Covid paralisou o planeta, cada um de nós sentiu o peso aterrorizante da sua face. O meu e nosso alento foi que ele viu sua obra concluída, editada e impressa. “Só faltou a festa”, foi o que Cynthia me disse quando nos falamos naquela manhã sombria e desoladora de 21 de agosto de 2021, quando ele não mais resistiu e partiu para outra dimensão para reiniciar uma nova jornada de contribuições configurada de todas as experiências que desenvolveu nessa passagem. De modo que salve a Raymundo Juliano, toda honra e toda a glória. Ele merece! 

 

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Abelardo soares
Grande homem visionário, nessa narrativa da competente Juliana Souto esplicita quanto importante foi para Sergipe !