Aparte
Opinião - A história não é para ser contada aos pedaços

[*] Rômulo Rodrigues

O Dia Nacional da Consciência Negra, celebrado em 20 de novembro, em memória do herói Zumbi dos Palmares, não pode ser restrito a grandes manifestações de rua onde se diz que vidas negras importam e que temos um governo genocida.

Onde se diz que direitos trabalhistas foram confiscados, que o feminicídio tem que ter um fim e que quem o pratica e praticou deve ser punido com rigor e as bandeiras históricas do povo, da classe trabalhadora devem ser hasteadas o mais alto possível.

O clamor, o furor e a energia do dia 20 de novembro não podem se esvair ao final de cada dia 20 de novembro, seja qual for o dia da semana.

Em 2021 foi num sábado, com todos os lugares, ruas e praças cheias de um povo que quer justiça, mas parece que quer para aquele dia!

Calma gente: é que na terça-feira seguinte foi o dia da ação de graça nos Estados Unidos da América e, logo depois, na sexta feira, o dia da glória suprema do processo de alienação consumista: “O dia do Black Friday”, totalmente esquecido nas comemorações do dia da consciência negra.

É triste e angustiante isso. Ninguém lembrou daquele dia fatídico, na Virgínia, EUA, quando em 1904, para enfrentar a crise econômica, os poderosos do comércio de pessoas escravizadas inventaram uma sexta-feira negra para vender escravos.

Vendê-los com descontos, numa liquidação. Ou queima. Foi daí que veio o nome Black Friday, alusivo a negros vindos da África e Friday, data da venda na última sexta-feira de novembro.

Não sejamos inocentes e nem cínicos. Com certeza, se vivo estivesse o Rei Zumbi conclamaria as nações para um gigantesco boicote ao tal do Black Friday.

Também foi solenemente ignorado um grande herói negro, João Cândido, o almirante negro, líder da Revolta da Chibata, de quem a Marinha brasileira não aceita colocar o nome no livro dos heróis.

Ao agir assim a Marinha brasileira está negando seu histórico glorioso de lutas contra o uso da chibata que era o instrumento de aplicar castigos aos marinheiros negros, revolta que aconteceu em 25 de novembro de 1910 e que tem tudo para ser inserido nas manifestações do dia 20.

O mais incompreensível é que nas manifestações em todo o país não houve sequer espaço para algum resgate da música “Mestre sala dos mares”, de João Bosco e Aldir Blanc. Mais do que esquecimento, isso é uma vergonha.

Mudemos aqui de assunto: bem ao seu estilo de manda quem pode e obedece quem é esquecido, o mercado comemora a maior alta da inflação para um mês de novembro, desde 2002, último ano de governo do tucano Fernando Henrique Cardoso.

Até parece praga de urubu choco. Enquanto o PSDB agoniza nas prévias, a Bovespa retira o touro de ouro da via pública e despenca no pior índice de desempenho no mundo em 2021, para a desmoralização do capitalismo e saudade do tempo do comunismo da era Lula, quando cresceu 500%.

Mas, como a burguesia não esquece seu papel de classe, sua revista Veja estampa na capa um triplo “Não”, tentando igualar Lula, Bolsonaro e Moro.

Em síntese, a doutrina da supremacia do deus mercado precisa que a memória dos oprimidos, massacrados e excluídos seja lembrada por partes e nunca ao todo, enquanto sua destruição seja aplicada ao todo com a volta da inflação de dois dígitos, do desemprego em massa e aniquilamento da capacidade produtiva em massa. Ô, Ô, Ô vida de gado!

[*] É sindicalista aposentado e militante político. 

 

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