Aparte
Um coçar de orelha irritante acerca da ainda insepulta eleição da OAB

Sim, Danniel Costa, com quem vossa excelência irá à festa do Quinto Constitucional?

Em “Uma leitura justa e sensata do mando da OAB, das vitórias e das derrotas recentes”, publicado na última quinta-feira, 25, com larga repercussão, a análise ateve-se, como sugere o próprio título, às querelas e questiúnculas meramente eleitorais e às prováveis implicações causais para a vitória da oposição na eleição da Ordem dos Advogados do Brasil em Sergipe neste 2021.

Para além desse objetivo, diante de uma Ordem seguramente imprescindível como entidade representativa, histórica e socialmente, nas questões mais caras à população, de cuja guarda e zelo detém atribuições constitucionais, aflora um questionamento intrigante e persistente: que “ânsias” outras fariam uma classe inteira mobilizar-se, e mobilizar uns e outros, para ter(em) o mando da sua entidade corporativa? Seria só o desejo querendo papar o desejo?

De começo, lá desde a sua formação, a OAB teve - e ainda terá, espera-se - compromisso firmado em defesa da Justiça, do respeito às regras da lei e da paz social, atuando como um escudo da democracia e da Constituição. Logo, seria uma entidade para além de uma classe e a serviço da nação. 

Haverá, obviamente, quem queira o mando dessa entidade por tais razões e feições - e apenas por elas, o que já seria, por assim dizer, de “bom tamanho” diante da grande tarefa a se travar em torno do bom embate que resulta desses valores. Mais ainda nessa hora pândega e quase fúnebre da nação brasileira, que anda a lamber as patas disformes do fascismo.

Para realizar o intento de proteger o interesse público, a OAB conta com o respaldo da sociedade civil. A instituição, segundo recente pesquisa do Instituto Datafolha, goza de bom prestígio e ótima credibilidade junto à população brasileira: de caráter nacional, a estudo ouviu mais de duas mil pessoas em 135 municípios - 66% dos entrevistados disseram “confiar na OAB”.

PAUSA PARA A HISTÓRIA – Lá se vão 87 anos do Quinto Constitucional, instituído no ordenamento jurídico brasileiro para normatizar a participação da advocacia, por indicação da Ordem dos Advogados do Brasil, na formação dos tribunais de segunda instância e também dos órgãos federais responsáveis por monitorar administrativamente o Judiciário e o Ministério Público.

Em termos nacionais, o presidente do Conselho Federal da OAB pode impetrar processos no Supremo Tribunal Federal - STF - e em outros órgãos federais, como ação direta de inconstitucionalidade, em que é possível questionar a legalidade e a validade de leis ou as normas federais ou estaduais.

Em tese, a OAB apresenta-se como uma entidade independente, não subordinada a nenhum órgão estatal e que possui previsão na Constituição Federal como indispensável à democracia e à função jurisdicional.

Na vida real, porém, o umbigo às vezes brota no joelho. O pleito de 2021 da OAB tem cheiro e gosto - também - de Quinto Constitucional, com “ânsia” na vaga de desembargador a vicejar em 2023 com a aposentadoria de Edson Ulisses de Melo, que já presidiu essa instituição.

As forças políticas adensadas em torno da candidatura do são  Danniel Costa surpreenderam pelo volume e contundência. Nunca uma eleição da OAB em Sergipe agregou e congregou tantas lideranças com tamanha capacidade de pressão e influência política, notadamente prefeitos e ex-prefeitos – tema que perpassou o artigo da quinta-feira.

Esse notório poder de forças, somado ao poder econômico, foi fundamental para cimentar a vitória de uma oposição unida e aguerrida ante um adversário paralisado pelas vaidades e veleidades internas.

De um lado, atuou a Federação dos Municípios do Estado de Sergipe - Fames –, como braço tático e arrecadador. Do outro, presidentes de câmaras municipais da capital e do interior, dirigentes partidários ligados ao governo estadual e “terceirizados”, como aquela uma certa “OAB sem partido”, ninho de vários políticos hoje sem mandato, que agiram junto às procuradorias municipais e núcleos da advocacia que prestam serviços a prefeituras e partidos, isso de modo bastante silencioso.

Nesse tocante, aliás, a advocacia, em quem o artigo de quinta viu um certo reacionarismo político, não exerceu o mesmo “incômodo” dispensado ao pajé Henri Clay Andrade, cuja ligação com a política partidária - ele é filiado ao PSOL e vários membros da Chapa 1 também estão alistados nessa agremiação - tem sido usada como pretexto para atribuir-lhe culpa pela derrota de Inácio Krauss, o que em parte tem razão de ser. Mas apenas em parte dessa parte. É sempre bom relembrar que, como seres reacionários, os advogados por vezes se camuflam bem.

Além dos obviamente vistosos “olhos gordos” fixados na vaga de desembargador - e já há nomes postos entre o grupo vitorioso, como o vestal Márcio Conrado e Inácio Krauss vai querer indicar alguém –, tamanha junção de “almas tão puras e desinteressadas” provoca um coçar de orelha irritante acerca de como ficará a independência da OAB: em discussões importantes envolvendo a atuação da classe, como direitos a prerrogativas funcionais e honorários, contra órgãos ligados à administração pública, com quem Danniel Costa irá à farra ou à festa?

Aqui, é preciso torcer para que tudo isso seja apenas isso mesmo: um irritante coçar de orelha, e passageiro! Até porque seria péssimo, dir-se-ia horrível mesmo, que a OAB - pasme o leitor, a leitora! - servisse de “trampolim” para a eleição do próximo Quinto Constitucional ou de anteparo aos interesses mesquinhos da política, que agora se aproxima mais do que nunca da instituição. Ah, e antes que se caia no esquecimento, convém lembrar que quem avisa amigo é!

 

PS - Em verdade, nesta nota cometo uma imprecisão. Não será da advocacia a vaga a ser gerada no Poder Judiciário de Sergipe com a futura aposentadoria do desembargador Edson Ulisses de Melo. Será do Ministério Público. Isso altera, ainda que minimamente, a fisiologia da nota, sobretudo quando nela cito nome de advogado que estaria de olho no preenchimento. Escusas.

 

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