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Léo Mittaraquis diz com “Sob a Régua do Expediente” que a poesia não é uma arte para muitos
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Léo Mittaraquis: um sujeito de punhos verbais rigorosos

A poesia não é uma arte para muitos. Não por esnobismo deliberado dela. Mas por anatomia mesmo da linguagem que ela inventa, e da qual se serve e se faz.

Se se espargir frouxa e desengonçada por aí sobre a vida e as páginas dos livros, poesia não é. Pelo menos a digna deste nome, poesia não haverá de ser.

Ela, a que seja digna deste nome, exige esmero e zero histrionismo confessional. Cobra labor e suor. Demanda rigores, e exige que seja infensa a concessões e populismos farfalhosos.

E é exatamente suada, laborada e sob bons rigores a poesia que Léo Mittaraquis lançará neste sábado, dia 22, no Café Literário do Espaço Alquimia Cultural, às 16 horas, com o livro “Sob a Régua do Expediente”, cujo título já enuncia, ou denuncia, o foco dele e de sua escrita. (O Alquimia fica no cruzamento da rua Euclides Paes Mendonça com a rua Fenelon Santos, no coração do bairro Salgado Filho, em Aracaju).

Extremamente sem concessões, esse tal de Léo Mittaraquis, que é também um duro crítico de arte, sabe “calcar” o “signo” da sua fala existencial sobre a “úmida ou crestada terra” que é a literatura e que é a vida.

“Característica forte do seu trabalho é o esmero em desarrumar a construção trivial de frases, para que possamos todos enxergar riquezas escondidas que as palavras, talvez por pudor, teimam em ocultar”, escreve sobre ele e sobre seu “Sob a Régua do Expediente” o também poeta sergipano Marcelo Ribeiro.

Marcelo Ribeiro foi correto e preciso em suas observações. É fato que Mittaraquis investe no experimento formal e conceitual da linguagem, explorando as possibilidades oferecidas, ainda que nem sempre de maneira imediata, à superfície, pela língua portuguesa.
 

Capa bem conceitual de “Sob a Régua do Expediente”

Por uma coincidência de malungos, no poema “Um eu, o outro” deste “Sob a Régua do Expediente”, dedicado exatamente a Marcelo Ribeiro, Léo Mittaraquis dá passadas largas na amostra do que propõe e do que exercita na sua poesia, com um lirismo de empenar ossaturas.

“À larga tala, calcas,/ Teu signo sobre úmida ou crestada terra./ Abençoado sejas, irmão em armas,/ Ao lado teu também assino,/ Indeléveis pegadas feridas”, diz a abertura do poema. Sim, é papel dos rigorosos que se dão à poesia assinar mesmo “Indeléveis pegadas feridas”, diz o primeiro bloco do poema.

Mas “Um eu, o outro” diz bem mais, ao fazer urzes se insinuarem contra, ou a favor, dos amanhãs improváveis para além dos “lamelosos dias”. Ouça mais um tiquinho: “Assim como eu,/ Desbravas um campo pobre./ Porém, vê bem, dileto cupincha,/ Mesmo ao longo de lamelosos dias,/ Brotam urzes a acenar ao próximo amanhã”.

Porém, de tão bem realizado, o poema “Um eu, o outro” pede para se expor aqui por inteiro ou no que lhe resta e se estatelar como a prova cabal da plena falta de populismo deste Léo. “Entre nós, a abdicar de tribuna e púlpito,/ Elegemos, livres, mútuas afinidades./ E se ao longo de aforismáticos dias,/ Pelo mundo à parte postos somos,/ Sustenta-nos sermos mútuos guias”.

E vem o mais valoroso no fecho dele: “Remansos de fogo e pó,/ Não nos porão à deriva./ Aferrados que somos pelo pacto cordial,/ Irmãos estelares, dóceis às leis dos céus,/ Recontamos, acima, duzentos e setenta e nove luzeiros”.

Este “Recontamos, acima, duzentos e setenta e nove luzeiros” é fecho de ouro que só os grandes poeta auferem. Sim, não é sem causa que este texto diz em sua abertura que a poesia não é uma arte para muitos.

Mas convém alertar ao leitor que “Sob a Régua do Expediente” não é, obviamente, feito apenas do poema “Um eu, o outro”. Outros 64 desfilam nessa publicação, que é a primeira de caráter solo de autoria de Léo Mittaraquis, um sujeito de 60 anos, graduado em Filosofia e mestre em Educação pela Universidade Federal de Sergipe, que é redator publicitário e consultor acadêmico, mas que nas horas vagas está sempre de cinzel em punho a modelar poemas como os que enfeixam esse seu primeiro livro.

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Jaime Almeida da Cunha
Bonito poema , Um Eu, o Outro, bela matéria de apresentação do poeta, só poderia ser escrita por outro grande poeta
Léo Mittaraquis
Honrado sobremaneira pela larga deferência, dileto amigo🍷☕